#6 Maristela Just
O Caso
Maristela Ferreira Just nasceu em 1964, filha de
Dirce Ferreira Just e Zaldo Magalhaes Just. A família morava em Jaboatão dos
Guararapes, há uns 13 km de Recife.
Ainda
muito nova, conheceu José Ramos Lopes Neto.
José,
nascido em Recife, ano de 1963, era filho de Maria Júlia Lopes Teobaldo e Gil
Teobaldo de Azevedo, um advogado criminalista muito conhecido não só em Recife,
mas em toda a região metropolitana.
Quando
eles se casaram, Maristela tinha 20 anos e José, 21. Juntos, tiveram 2 filhos:
Nathália e Zaldo. Por um tempo, eles parecem que moraram na casa dos pais de
Maristela. Os problemas entre eles, começaram quando José tornou-se um
acomodado. Apesar de ele ser relacionado a profissão de comerciante, José não é
descrito como uma pessoa muito chegada a trabalhar ou ao trabalho. Ele ficava
muito pouco tempo em um emprego, trocava constantemente, sempre tinha uma
desculpa pra não ficar em nenhum e essa falta de interesse em ser uma pessoa
financeiramente ativa na família com duas crianças pequenas, acabou
contribuindo como a separação deles.
Quando
eles se separaram, em 1987, Maristela já estudava Sociologia e trabalhando com
venda de cosméticos. Ela foi com os filhos morar em um apartamento e o Jorge ia
frequentemente lá.
Porém,
ele passou a segui-la, a vigiá-la e até a acusá-la de estar tendo casos na
faculdade.
Contam
que uma vez ela chegou a fazer um Boletim de Ocorrência contra o José após ele
a machucar. Ele puxou o braço dela com força contra a grade do portão do prédio
onde ela morava durante uma discussão.
Pra se sentir mais segura e
poder contar com a ajuda dos pais, a Maristela volta pra Jaboatão dos
Guararapes, com os filhos, a Nathalia com 3, 4 anos e Zaldo entre 1 e 2 anos,
morar na casa dos pais, na época, eles moravam na R. Amaro Soares de Andrade,
94, no bairro de Piedade.
Após dois anos dessa separação,
no dia 04 de abril de 1989, José Ramos acompanhou Maristela e as crianças a uma
consulta médica. No retorno da consulta, José para o carro na praia de Barra da
Jangada, que fica em Jaboatão. Ele tenta convencer Maristela a voltar com ele,
eles batem boca e ele mostra a ela que estava armado. No banco de trás, estavam
as duas crianças, mas com os pais falando de forma alta, Nathália acorda e vê o
pai chacoalhando a mãe. José então para, ao ver a filha acordada e sai com o
carro em direção a casa dos ex-sogros.
Ao
chegar em casa, acompanha de José e os filhos, Maristela avisa a o irmão,
Ulisses que o José estava armado.
Enquanto
ela dava banho nas crianças, Ulisses e Zaldo, irmão e pai de Maristela, revistam
o José e não encontram nenhuma arma.
Jose
diz que quer conversar com a família, Maristela e as criança, sozinho. Ela
estava no quarto arrumando os filhos. Ele entra no quarto. Maristela estava
sentada na cama penteando o cabelo de Nathália e Zaldo brincava no chão ao lado
de uma cômoda.
Preocupado,
Ulisses vai junto, mas fica fora do quarto, encostado na porta, fumando.
José
abaixa, como se fosse brincar com o filho no chão, mas sem que ninguém
esperasse, ele pega a arma que estava no cano da bota dele e levanta.
Os
dois primeiros tiros foram na testa da Maristela. Nathália com quase 5 anos na
época, tentou correr e uma bala transpassou o ombro dela. José então mira na
cabeça de Zaldo, de 2 anos e 9 meses e atira. Ulisses entra no quarto e José
atirou no peito dele. Ele se volta para Maristela novamente e dá mais um tiro
na cabeça dela.
Ele
saiu do quarto tranquilamente e vai até a cozinha. Pega uma faca de pão e tenta
se cortar nas mãos. O que se relata é que, ele pega uma outra faca e disfere
facadas na própria barriga.
Zaldo,
o pai de Maristela, consegue imobilizar José sem ele tentar resistir. Os
vizinhos que ouviram os tiros, foram direto até a casa e ajudam na imobilização
e ligam para a polícia.
José
Ramos é preso em flagrante. Mas como estava ferido, é socorrido e levado para o
Hospital Getúlio Vargas onde ficou internado 4 dias.
Mas
essas facadas não foram uma tentativa de suicídio. Foram na verdade uma
tentativa de organizar uma linha de defesa. A autodefesa. Que foi o que ele
alegou. Que atirou pra se defender porque foi atacado.
No
fim dos 4 dias, ele foi levado para o presidio Anibal Bruno. Ficou por 8 horas
mais ou menos e de novo, é levado para o Hospital do IPSEP (Hospital dos
Servidores do Estado).
O
José confessou. Disse que estava de cabeça quente, que não pensou em fazer o
que fez, aquilo tudo o que já conhecemos.
As
crianças ficaram em estado grave no hospital. E sofreram sequelas. Nathália
ficou com os movimentos de parte dos dedos da mão direita comprometidos e
Zaldo, devido ao tiro na cabeça, teve afetado todo o seu lado esquerdo.
A
defesa do José, encabeçada pelo seu pai, o Gil Teobaldo, começa a impetrar habeas
corpus para soltar o filho. O 1º, era sob o argumento de que ele precisava de
um tratamento dentário só encontrado fora do presidio, foi negado.
Um
ano depois de preso, no dia 04 de maio de 1990, José foi solto sob um habeas
corpus que eles conseguiram após algumas tentativas.
Nathália
e Zaldo tiveram acompanhamento médico e psicológico por anos. O Zaldo por um
pouco mais de tempo.
Ela
foi criada pelos avós maternos e o Zaldo foi criado na casa de uma tia, mas cresceram
unidos, bem cuidados.
Em
anos, a avó paterna tentou contato com os dois uma única vez e o avó, defensor
do filho, entrou com uma ação de regulamentação de visita das crianças em nome
de José, estando o José, sumido.
A influência do Gil Teobaldo é muito citada
nas fontes para explicar a demora que todo esse caso teve. Lembrando que o
crime aconteceu em 1989 e ele solto em 1990.
Começando
com a anulação do inquérito policial, com testemunhas depondo mais de 3 vezes.
Com José trocando a sua defesa por 5 vezes para postergar o caso, já que a cada
novo advogado se pedia vistas o que demorava mais um tempão.
Durante
esse tempo em que nada parecia ser feito, o Gil Teobaldo, deu uma entrevista a
uma rádio, falando sobre o crime e não só isso. Ele fala que, o filho matou a
ex esposa por honra, já que Maristela, no momento da conversa entre eles, teria
dito ao ex-marido, que ele nasceu para ser corno. Gil também disse que se o
filho tivesse feito diferente, quer dizer, não tivesse lavado sua honra com
sangue depois de ouvir isso, José nunca mais se sentaria na mesa dele.
Foram
36 cartas precatórias, que é um instrumento de comunicação entre juízes, 5
recursos no TJPE, 2 recursos no STJ e 1 no STF.
E
com tudo isso, o crime que aconteceu em 1989 só teve a sentença de pronúncia,
que é o ato em que o juiz aceita a denúncia do MP e encaminha para a o Tribunal
do Juri o processo no caso de crime doloso, em 2001, quando o juiz João Roberto
Moreira envia para a 1ª Vara do Tribunal do Juri de Jaboatão dos Guararapes. Doze
anos depois.
Da
sentença de pronúncia para o julgamento, você acha que foi rápido? Claro que
não. Para a marcação do julgamento foram mais 9 anos. Ele só foi agendado para
o dia 13 de maio de 2010.
Durante
a adolescência, tanto Nathália quanto Zaldo, foram poupados pela família da
saga pela justiça pelo assassinato da mãe deles. Eles sabiam do que aconteceu,
até porque foram vítimas também, mas não eram expostos ao assunto, ao
andamento, as buscas da família inclusive por advogados, porque diversos
recusaram defender a família.
Mas
com o julgamento marcado, o caso voltou a mídia e Nathalia decidiu que era o
momento de se envolver e criou um blog sobre o caso da mãe, blog que ainda está
aberto.
Os
dois filhos de Maristela já eram adultos, formados, Nathália se formou em Publicidade
e Zaldo em Direito. Nessa época, Nathalia já tinha casado, ela se casou em
fevereiro de 2007 e já tinha saído de Recife e ido morar em São Paulo, depois
do marido receber uma proposta de trabalho lá.
A
juíza Maria de Albuquerque compareceu, abriu a sessão, os promotores
compareceram, mas nem o réu nem o seu advogado, Humberto Albino de Morais não
apareceram. Nem justificaram a ausência. Uma clara tentativa de anulação do
júri e postergação do julgamento. Ainda mais. O advogado foi multado em R$ 25
mil e 500 pela ausência.
O
júri precisou ser remarcado, mas a juíza, como talvez fosse o esperado, não
remarcou para muito após. Ela designou dois defensores públicos para defender o
José Ramos, emitiu um mandado de prisão e remarcou um outro julgamento para 01º
de junho de 2010, semanas depois.
Novamente
o José Ramos não compareceu e foi julgado a revelia.
A
juíza foi a mesma, os promotores foram Edgar Brás Mendes e Natalia Campelo e a
defesa capitaneada pelos defensores públicos, Flávia Barros de Souza e José
Inácio Cavalcanti. O júri foi formado por 4 mulheres e 3 homens.
No
fórum foram pessoas do Fórum de Mulheres de Pernambuco, representantes da OAB e
a família de Maristela.
A
defesa alegou que, José ao cometer o crime, não teve intenção de atirar nos
filhos e no ex-cunhado, tentando fazer cair as acusações de tentativa de
homicídio. A Nathalia prestou depoimento
no júri, contou o que ela lembrava e de como viu o pai virando e atirando em
todos.
Foram
15 horas de julgamento e ao final, José Ramos foi declarado culpado e condenado
a um total de 79 anos em regime fechado. Pelo homicídio duplamente qualificado,
foram 21 anos somados mais 5 anos e 6 meses pelas qualificadoras, então 26 anos
e 6 meses que teve uma diminuição de 6 meses pela confissão. Pelas tentativas
de homicídio contra os filhos, foram 19 anos e 6 meses por cada. Pela tentativa
de homicídio contra o Ulisses, outros 14 anos.
O
José Ramos estava foragido. E condenado. A próxima luta da família de Maristela
era conseguir com que ele fosse preso.
Em
setembro do mesmo ano de 2010, o Centro de Referência a Mulher de Jaboatão dos
Guararapes recebeu o nome de Maristela Just.
O
Disque Denuncia ofereceu o valor de R$ 3 mil reais por informações sobre o
paradeiro de José Ramos e a família de Maristela complementou esse valor para
completar R$ 10 mil.
Tanto
o FBI quanto a Interpol chegaram a ser acionadas porque José Ramos tinha
parentes nos EUA e a polícia brasileira temia que ele tentasse fugir para fora
do país.
Passou-se
o restante de 2011, 2011 e quase todo o ano de 2012 e nada de novidades. Treze
pessoas ligaram para o Disque Denuncias com pistas sobre o foragido, mas
nenhuma dava em nada.
Mas
uma acabou dando.
Nos
últimos meses de 2012, uma denúncia anônima entrou com o endereço onde José
Ramos estaria morando. E era bem mais perto do que se podia imaginar.
Dia
29 de outubro, o GOE, bateu a porta de uma casa no bairro de Espinheiro em
Recife, 16 km do Bairro de Piedade, em Jaboatão, onde tudo aconteceu.
Uma
senhora abre a porta, a polícia avisa o que estava fazendo ali, com um mandado
de busca e apreensão e no quarto de casal da casa, deitado, José Ramos é preso.
Ele
estava na casa da esposa dele, mãe de 2 filhos, dele.
Em
todos os anos como foragido, José Ramos Lopes Neto trabalhou, no momento da
prisão ele trabalhava com algo relacionado a agricultura, ele se casou, ele
teve filhos, ele viajou entre Piauí, Maranhão, Mato Grosso e ficou até um tempo
morando no Paraguai. E um mês antes, tinha voltado pra casa da mulher, alguém o
viu e denunciou sua localização.
Aí
talvez você tenha pensado por um momento: foi preso, acabou. Acabou não.
A
defesa dele de novo, até porque deu certo uma vez lá em 1990, impetrou um
habeas corpus ao TJPE, negado. Pediram ao STJ, negado. Pediram então ao STF,
negado pela Ministra Carmem Lúcia. Agora acabou? Não.
Brasileiros
que não desistem nunca, mesmo com a toda situação, os advogados de defesa,
impetraram um outro pedido de habeas corpus no STF em novembro de 2014. Dessa
vez a relatoria caiu com o Ministro Dias Toffoli. O Ministro votou a favor do
habeas corpus dizendo que, havia ilegalidade no julgamento conforme a defesa
alegava e a ilegalidade estaria na ordem da juíza em nomear defensores públicos
para o réu, o que não permitiria o princípio da ampla defesa, que está lá
assegurado no Art. 5º da CF, o que significa isso? Significa que o Ministro entendeu
que, como o réu não escolheu o seu defensor, o seu direito a ampla defesa não
foi respeitado e o júri então, era ilegal. Aí entrou outro Ministro, o Roberto
Barroso, que pediu vista ao pedido de habeas corpus e negou.
Novamente
não tinha acabado a determinação do José Ramos de se livrar da prisão. Através
de um laudo médico que dizia que ele estava com a saúde debilitada e não
poderia ficar preso, o José Ramos teve concedido seu pedido de prisão
domiciliar em outubro de 2017, concessão essa, que, pelo menos até 2020, que é
a informação mais recente, foi sendo renovada por 120 dias seguidamente,
permitindo que ele ficasse em casa.
Atualmente,
o Zaldo, trabalha ou até pouco tempo trabalhava como assistente jurídico, ele
tem dificuldade de movimentação do seu lado esquerdo inteiro do corpo. A
Nathalia fez um concurso publico para oficial de justiça em SP, passou e hoje é
a profissão dela, e é mãe de 2 meninos.
O
tio deles, Ulisses, também uma vítima, infelizmente faleceu de complicações da
AIDS em 1999. Ele acabou indo embora antes de conseguir ver justiça pra irmã
que ele perdeu, para os sobrinhos e para ele mesmo.
Fontes de Pesquisa
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