#3 Patrícia Longo

 

O Caso







Patrícia Aggio Longo e Igor Ferreira da Silva conheceram-se na Faculdade de Direito em 1994. Ela, aluna do 5º ano. Ele professor de Processo Penal.

 

            Patrícia era filha do casal Maria Cecilia e Jorge. Ela tinha outros 2 irmãos, Eduardo e Angélica.

 


João Longo com os 3 filhos: Patricia, Angélica e Eduardo



            Igor vinha de uma família de advogados. Seu pai, Henrique Ferreira da Silva, era advogado. Igor e os 3 irmãos também se formaram em Direito.

 





            O Igor é sempre descrito como um aluno brilhante. Ele passou nos primeiros lugares no concurso para delegado de polícia. Ainda muito novo e foi trabalhar na Delegacia de Bragança Paulista. Depois, ele prestou concurso para Promotor de Justiça e ficou nas primeiras colocações.

 

            Aos 28 anos, Igor já tinha sido delegado de polícia, era promotor de justiça e dava aulas na Faculdade onde Patrícia, de 24 anos, estudava.

 

            Além disso tudo, ele era diretor de jurisprudência da Escola Superior do Ministério Público.

 

            A relação de Patrícia e Igor evoluiu rápido.

 

            No dia 20 de setembro de 1997, eles se casam.

 

           






            E logo a Patrícia fica grávida. Era um menino e o nome escolhido para ele foi Ícaro. O Igor era apaixonado por voo livre e Icaro na mitologia grega, era segundo a lenda, filho de Dédalo, um homem habilidoso, um dos mais criativos de Atenas e inventor, ele quem projetou o Labirinto do Rei Minos. O Dédalo foi punido a prisão junto a Icaro seu filho e lá ele montou asas.  Infelizmente, Icaro acabou voando alto demais e o Sol queimou as penas das asas e ele caiu, morrendo.






            Mas Icaro acabou não tendo a oportunidade de viver.

 

            No dia 03 de junho de 1998, Patrícia vai para a casa dos pais. À noite, Igor vai até lá buscá-la na caminhoneta Dodge Ram.

 

            Ao irem embora a noite, Eduardo Longo, irmão de Patrícia, conta que ele combinou com Igor de ir a Atibaia, onde eles moravam, para fazerem um churrasco e pintarem o quarto do bebê. Patrícia estava com 8 meses de gestação.

 


Patricia com o pai e o irmao Eduardo



            Foi a última vez que a família viu Patrícia viva.

 

            Chegando no km 45 da Rodovia Fernão Dias, Igor entrou em um atalho de terra batida, em Ribeirão dos Porcos, um bairro de Atibaia. Era uma estrada de terra, com pouca iluminação e não muito utilizado, mas segundo Igor, para fugir do tráfego de caminhões da Fernão Dias, ele sempre pegava esse atalho.

 

            Ele entra no condomínio Jardim Shangrilá.






 

            Vamos primeiro falar da versão de Igor para o que aconteceu quando eles chegaram no condomínio.

 

            Assim que ele entra, na portaria, um homem armado o rende e manda que ele desça do carro. Quando ele desce, o cara entra no carro e entra para o condomínio com o carro e Patrícia dentro, sendo seguido por uma moto que ele achava ser um cumplice do assaltante.

 

            Ele decidiu voltar pela estrada e andar 3km até um posto da Polícia Rodoviária que fica ainda, na beira da Fernão Dias.

 

            Lá ele conta que o carro dele tinha sido roubado com a esposa grávida dentro.

 

            A polícia vai até o local e encontra o carro um pouco mais a frente de onde Igor relatou que tinha sido rendido, mais ou menos 1km da entrada do condomínio. Patrícia estava agonizando no banco carona do carro. Ela tinha sido atingida por 2 tiros. Um tiro na cabeça e outro nas costas a uma distância de 5 a 20 cm. Dentro do carro tinham cápsulas de calibre 380.

 








            Ela foi socorrida, levada para o hospital Santa Casa, mas não aguentou e faleceu ao chegar. O laudo necroscópico confirmou que Patrícia morreu de hemorragia cerebral com fratura na base do crânio.

 





            A descrição que Igor forneceu do homem que o rendeu era de um moreno parecido com um misto de Maguila com o Romário.

 

            O caso começou a ser investigado pelo delegado Fernão Dias da Silva Leme, amigo de Igor desde que juntos fizeram Acadepol, quando passaram no concurso para delegado.

 

            O velório e enterro de Patrícia e o filho aconteceu no dia seguinte, 05 de junho.





           

            Vários amigos de Igor do Ministério Publico compareceram ao enterro, incluindo o procurador geral daquele ano, Luís Antônio Marrey.

 

            O delegado Fernão, no próprio velório, pede ao Igor o paletó que ele estava usando, o mesmo desde o dia anterior, do crime. Ele conta que pedirá um exame residuográfico em Igor, para tentar detectar pólvora.

 

            O que, segundo o delegado conta, acontece é que Igor pede pra ficar com o paletó porque não estava com nenhuma outra roupa e não queria ficar só de camisa branca no velório. O delegado permitiu. O Igor também parece que por um longo período sumiu no enterro e que esse tempo sumido ele passou no banheiro se lavando com sabonete. Talvez, em alguma tentativa de mascarar a presença de pólvora nas mãos dele.

          

            O combinado foi de que no dia seguinte, Igor iria até a delegacia levar o paletó.

 

            Mas não foi só isso que aconteceu no enterro. Lá mesmo, o procurador de justiça foi avisado que, o promotor de Atibaia, Arthur Migliari Junior, estava desconfiado de Igor depois de ouvir o depoimento do vigia do condomínio.


            Logo após o crime, a polícia ouviu o vigia do condomínio Jardim Shangrilá, Daniel Francisco Matos.

 

            Em seu depoimento, o vigia diz que viu a caminhonete entrando e que depois viu um homem claro de terno e gravata na estrada andando. Quando o carro entrou não tinha nenhuma moto atras.


            Para a polícia, tudo parecia indicar que Igor estava envolvido no assassinato da sua esposa e filho. Na versão deles, Igor e Patrícia voltaram aquele dia no carro brigando ou discutindo e que, Igor decidiu entrar no atalho e no calor da briga, ele acabou atirando nela com a arma que ele sempre tinha com ele.

 

            Nada tinha sido levado do carro. O que levantava ainda mais dúvidas na polícia da narrativa de assalto. O ladrão ter mandado Igor sair e levar um carro com uma gestante, também soava estranho. Por que eles iriam querer levar um carro com uma grávida e deixar o homem ir embora podendo ir pedir ajuda? E porque só andar tão poucos metros com o carro, não mexer em nada e dar dois tiros em uma grávida quase a queima roupa?

 





            O Igor foi na delegacia levar o paletó. Ele entregou um paletó preto. O delegado na mesma hora disse ter comentado que aquele não era o mesmo paletó porque o do dia do crime e do velório, era azul marinho. 


            O Instituto de Criminalística fez o exame residuográfico e deu negativo. A imprensa comparou o paletó entregue com as filmagens do dia do enterro em que Igor aparece e dizem que era paletós diferentes. O exame das mãos dele também deu negativo. Os peritos dizem que ele chegou para o exame dizendo que no sábado anterior ao crime, no dia 30 de maio, ele tinha atirado então poderia ter vestígios. Mas o exame deu negativo e Igor passou a negar que tivesse dito que atirou dias antes.

 

            O vigia Daniel reconhece Igor na delegacia e diz que aquele era o homem que ele viu andando na estrada naquela madrugada.

 

            As investigações pareciam apontar cada vez mais para Igor.





 

            Ainda nesse começo da investigação, um ladrão de casas e condomínios foi preso. Ele atuava na região de Atibaia e era parecido com o jogador de futebol Romario. Ele foi preso em São Paulo e levado para Atibaia pra que Igor pudesse tentar uma identificação.









            Porém ele diz que aquele homem não era o assaltante que o rendeu. Nada ligava o homem ao crime e com Igor não o identificando, tudo voltou ao ponto em que estava.

 

            Foi realizada uma busca e apreensão na casa do Igor e da Patrícia e uma coisa chamou atenção, de acordo com a promotora responsável pelo caso, Liliana Buff: a ausência de coisas de bebê. Ela diz que, na casa, não foi encontrado nada que levasse a crer que uma criança estava para nascer. Não encontraram enxoval, não tinha um quarto de bebê, não tinha berço, não tinha brinquedos, não tinha nada que se esperava ter em uma casa que em 1 mês ou até menos, teria uma criança vivendo.

 





            O irmão da Patrícia refuta essa informação. Ele diz que existia sim um enxoval para a criança comprado não só pela irmã dele, mas pela mãe também. Em março daquele ano as duas saíram juntas e compraram várias coisas além de diversas coisas que a família sempre comprava e dava de presente.

 

            Ainda na casa, atras de um tanque, foi encontrado um saco com 43 capsulas de calibre 380, mesmo calibre que matou Patrícia. O que só aumentou a crença de que Igor era o assassino.

 

            Igor andava armado e todo mundo sabia disso. Ele costumava praticar aulas de tiro. Todo mundo também sabia disso.

 

            Então onde estava a arma que ele usava? Vendida!

 

            Ele vendeu a arma durante a época de anistia da lei de porte de armas só que ele não sabia para quem foi vendida e não encontrava mais essa pessoa que comprou.

 

            Ainda em junho de 1999, armas de uso restrito, pistola 9mm, foram encontradas em um sítio e ligadas não só ao Igor como a um dos irmãos dele, Eger.

 

            No dia 20 de junho, ele e o irmão acabam presos por porte ilegal de armas.

 

            Cinco dias depois, o Tribunal de Justiça manda soltar os dois.

 

            No decurso de tudo isso, um homem envia uma carta para a juíza corregedora de Atibaia confessando o assassinato de Patrícia Longo.

 





            João Genivaldo dos Santos estava preso por latrocínio e estupro em Guarulhos.

 

            Supostamente o caso poderia estar resolvido. Mas não estava.

 

            A polícia acabou descobrindo que dois irmãos de Igor foram usando da prerrogativa de advogados, em Guarulhos onde João Genivaldo estava preso.

 

            A mulher dele, Ana Lucia Leite Pereira conta que ofereceram R$ 5 mil reais para que ele assume o crime da mulher morta pelo promotor. Além do dinheiro, eles prometeram que poderiam protegê-lo na penitenciaria. Ele aceitou e a pedido de Eger, escreveu a carta confessando.

 

            No dia 07 de agosto de 1998, a Procurador de Justiça, Luiz Antônio Marrey, o mesmo que estava no enterro de Patrícia, aceita a denúncia contra Igor Ferreira da Silva.

 





            Por ser um membro do Ministério Público, Igor seria julgado pelo Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Tribunal de Justiça de São Paulo. Mesmo denunciado por homicídio qualificado, por meio que impossibilitou defesa da vítima e por aborto voluntário, ele não iria a um Tribunal do Juri.

 

            O Órgão Especial é formado por 25 desembargadores: o presidente do Tribunal de Justiça, 12 desembargadores antigos e 12 desembargadores eleitos. Aquela seria a primeira vez na história do TJSP que eles julgariam um membro do MP por homicídio.

 

            Igor ficou detido no 7º Batalhão da Cavalaria da Polícia Militar por 40 dias, sendo solto em 18 de novembro de 1998 após o Órgão Especial revogar o pedido de prisão preventiva.

 

            O advogado de defesa de Igor era o advogado Márcio Thomaz Bastos, que alguns poucos anos depois seria Ministro da Justiça no 1º Governo Lula.

 

            Durante todos esses acontecimentos, a família da Patrícia ficou ao lado de Igor. Para eles, o genro e cunhado era inocente e que se ele tivesse envolvimento seria em, a partir do seu trabalho contra criminosos, ter se tornado um alvo de vingança, que acabou vitimando Patrícia.

 







            Igor foi afastado do Ministério Público no dia 14 de agosto pelo conselho do MP por 60 dias ainda recebendo seu salário, que era em torno de R$ 6 mil. Só para comparação, o salário-mínimo vigente em 1999 era de R$ 136 reais e de R$ 151 reais em 2000.

 

            O próximo passo da defesa de Igor foi fazer o pedido de exame de DNA do filho dele não nascido.

 

            Muito se especulava sobre qual seria a motivação do crime e que ela seria ciúmes. Com o exame, a defesa acreditava que provaria que não havia motivos para ciúmes. Eles eram praticamente recém-casados e a espera do primeiro filho, que era de Igor.

 

            Só que as coisas não saíram como se esperava que aconteceria.

 

            Pra que fosse possível o DNA era antes preciso exumar Patrícia. O pedido de exumação foi deferido pela justiça e foi feito em 22 de fevereiro de 1999.

 








            O laudo ficou pronto no dia 14 de junho de 1999. O exame foi feito pelo Laboratório de Biologia Molecular Aplicado da Faculdade de Ciências Farmacêuticas da USP pelo Dr. Mario Hirata.

 

            O que ele afirmava era que:

 

 

            “Não há vínculo genético entre o Sr. Igor Ferreira da Silva e o Natimorto de Patrícia Aggio Longo baseada na análise de 14 sistemas polimórficos do DNA humano.”

 

 

            Foi um choque. O exame concluiu que o bebê não era do Igor.

 

            A defesa e a família começaram a contestar o resultado. O pai de Patrícia contratou uma empresa, a DNA Consult, para verificar o laudo emitido pela USP e de acordo com o Dr. Euclides Matheueci Junior, o exame era inconsistente e sem valor científico.

 














            Porém o juiz do caso não permitiu a realização oficial de uma contraprova, mas também não permitiu que o exame de DNA fosse usado no julgamento contra Igor.

 

            No Acordão, é relatado:


 

 

            “O acusado foi quem pediu, com empenho, esse exame. A única interpretação possível para tal comportamento é a de que ele, acusado, tinha a convicção plena de que era pai de nascituro. Caso não tivesse tal convicção, não haveria de requerer uma perícia de tal gravidade e precisão, pois estaria correndo desnecessariamente risco de a prova vir em seu prejuízo.”

 

 

 

            O julgamento do Igor aconteceu no dia 18 de abril de 2001. Sendo no Órgão Especial, Igor não precisava estar presente e não esteve. O advogado dele o representou. Por unanimidade ele foi condenado a 16 anos e 4 meses por homicídio qualificado e abortamento sem consentimento. Dois anos e 4 meses por aborto e 14 anos por homicídio.






 

            Apesar da promessa do advogado de que, Igor se entregaria, ele fugiu.









 

            E por 8 anos, não se soube o paradeiro de ex promotor Igor Ferreira da Silva.


            A casa em que ele e Patrícia possuíam foi vendida por R$ 140 mil.

 

            Pistas davam que ele poderia estar em Florianópolis, outras que ele poderia ter ido para o Chile.

 

            No mesmo ano, 2001, ele foi condenado novamente pelo porte ilegal de armas a 2 anos. O Ministério Publico achou pouco e recorreu. A pena subiu para 3 anos em 2003.

 

            A exoneração do Igor só saiu 5 anos após a condenação dele pelo crime, em 2006.

 

            Passa-se anos e chegamos em 2009. Em outubro de 2009, a polícia recebe uma denúncia anônima de que o ex promotor estaria na Rua Dentista Barreto, em Vila Carrão, um bairro na zona leste de São Paulo, em frente a um condomínio. E ele estava.

 




            Igor foi preso e levado na 5ª Delegacia.

 





            E ele continuava se dizendo inocente e a família de Patrícia ao lado dele.

 

            Ele foi remetido ao presidio P2 de Tremembé, onde também estão outros presos famosos, como estava o Daniel Cravinhos, o Alexandre Nardoni, o Roger Abdelmassih, o Mizael Bispo, o Gil Rugai, o Lindberg Farias entre outros tantos.





 

            Ele pediu em 2013 para ir para o regime semiaberto, mas o pedido foi negado pela 1ª Vara de Execuções Criminais de Taubaté. Ele conseguiu a progressão em 2014. Tinha direito a 5 saídas por ano.

 

            Ainda em 2014 ele recebeu autorização para prestar vestibular. E ele passou. Não consegui confirmar para qual curso ou se ele ainda está cursando, mas ele fez a matrícula no curso em julho de 2014, de acordo com o processo de execução penal dele.

 

            Em 2016, o seu novo advogado de defesa, Leandro Lanzelloti de Moraes, solicitou a progressão para o regime aberto, pedido que foi negado porque parece que ele se recusou a fazer exames criminológicos necessários.

 

            Mas ele logo em seguida teve o deferimento do pedido e em 2016 ele saiu.

 

            A pena do Igor será totalmente cumprida em abril de 2025, daqui a 5 meses.

 

            Como eu disse, a família da Patrícia, até onde se tem notícia, acredita na inocência do Igor. Ele mante que não foi quem disparou os dois tiros contra Patrícia.

 

           





  Fontes de Pesquisa



Conjur

R7

O Globo

O Globo

Folha

Folha

TJSP

Veja

Senado

Bem Parana

Painel Politico

Youtube

ESAJ TJSP

 UFC

Youtube

Até que a morte nos separe T01 Ep01 "O promotor Fugitivo"

Eluf, Luiza Nagib. A paixão no banco dos réus:casos passionais e feminicidio. 9ed. São Paulo-Saraiva, 2017


           


Comentários

Postagens mais visitadas