T03 Ep07 O caso do Cortabundas

 O Caso







 

         O Conjunto José Walter foi construído em 1970 com mais de 4 mil km² e umas 5.500 casas, com mais ou menos 30 mil pessoas habitando o bairro.

 

         Na época, era o maior conjunto habitacional da América Latina.

 




         E era um local tranquilo, sem muitos acontecimentos e a maioria dos moradores era bem humilde.

 

         Até que em 1985, os moradores perdem toda a tranquilidade.


         Uma das primeiras vítimas do maníaco que ficou conhecido como o Cortabundas  ou o Corta Nádegas, foi Suedi Zingla.

 




         Ela foi atacada por um individuo durante a madrugada enquanto dormia no seu quarto. Ela foi cortada em uma das nadegas e precisou de 40 pontos.

 

         Suedi não conseguiu ver quem era. O maníaco não deixou pistas. Ninguém viu entrando, ninguém viu saindo.

 

         E a Suedi foi umas das primeiras das mais de 70 vitimas que ele faria nos próximos anos.

 

         Com a quantidade de casos aumentando, os moradores ficaram apavorados.

 





         A policia parecia sempre atrasada. Quando chegava, o ataque já havia acontecido. As vitimas não viam o agressor.

 




         O numero de vendas de fechaduras aumentou substancialmente. Até o numero de furtos e roubos caíram na região. Os bandidos tinham medo de serem confundidos com o Cortabundas. Ladrão sim, cortador de bundas não.

 

         Os ataques aconteciam a noite nos primeiros ataques, por volta das 10 da noite.

 

         Quem tinha condições financeiras, colocava grades nas portas e janelas.

 

         Quem não tinha, a cada noite, empilhava panelas, canecas ou qualquer coisa que fizesse barulho em lugares que o maníaco poderia entrar e alertar. Teve quem colocasse no portao um fio elétrico energizado, pra que quando o maníaco colocasse a mao, tomasse um choque.

 




         Socorro Alves de 19 anos, estava ajudando a cuidar da sobrinha e acabou dormindo. Mas enquanto dormia, na madrugada, sentiu a pele dela arder e ainda um pouco sonolenta, achou que uma lagarta tinha a mordido. Ela ergue um pouco o corpo e viu, escorrer pela perna, sangue, vindo das nadegas. Tinha sido mais uma vitima do Cortabundas.

 

         Apesar do corte não ter sido tão profundo, no hospital, precisou de 250 pontos para fechar o ferimento.

 

         O Cortabundas usava nos ataques giletes, navalhas, estilete, sempre objetos cortantes, mas não fatais.

 

         E ele nunca encostava nas vitimas sexualmente, tentava estupra-las ou era fisicamente agressivo.

 

         Não se sabia o porque, mas ele entrava, cortava a bunda e ia embora.

 




         As vitimas variavam de idade, dos 10 a casa dos 30. Sempre mulheres. Sempre dormindo.

 

         Adriana Saldanha de Souza foi segurada pela cabeça contra a cama e cortada.

 





         Maria dos Reis de 27 anos, estava deitada na cama com a filha, Kariane. Ambas foram cortadas.

 





         Maria da Conceição Fernandes, de apenas 17 anos, dormia ao lado do companheiro quando foi atacada. Mesmo com a presença de um homem na casa, o Cortabundas não se conteve. Maria foi cortada 6 vezes com uma navalha. Antes que o casal pudesse ver algo, ele fugiu. Os dois ligaram para a policia, que chegou a deter um suspeito, um homem que andava na rua perto da casa de Maria.

 

         Ela foi para o hospital e precisou de 114 pontos, mas o homem detido foi solto. Ele não era o Cortabundas, depois da policia averiguar quem ele era.

 

         Algumas das mulheres atacadas estavam grávidas inclusive, pra se ver o ponto em que quem estava atacando essas mulheres chegou.

 

         Perpetua Barbosa de Carvalho foi agredida em casa e o corte feito pelo Cortabundas chegou até suas partes intimas.

 

         A policia mostrou a ela um homem, que poderia ser o agressor, mas novamente, não tinha como saber quem era, porque ela simplesmente não o viu.

 

         Era realmente uma situação muito desesperadora. E por outro lado, difícil de se acreditar.

 

         A imprensa já estava cobrindo o caso intensamente, então surgiu a hipótese de que tudo aquilo não passasse de um boato, uma lenda, uma histeria coletiva. Como era possivel alguem entrar e sair de uma casa, cortar alguem com gravidade e ninguém nunca ver?

 

         E ai começam as teorias. Era era alguem com o pacto com o Diabo? Que fazia com que ele ficasse invisível, por isso ninguém conseguia enxergar ele? Ou ele era um morador e que sabia como fugir e como entrar porque ficava espreitando?

 

         Os ataques já era muito constantes. Muitos tinham intervalos de 2 ou 3 dias um do outro. Teve dia dele atacar mais de 1 casa de uma vez.





         Vera Lucia foi atacada deitada na sua rede, dentro de casa. Ela conta como foi em um documentário sobre o Corta Bundas.


         Uma outra vitima do Maniaco, Simone, de 27 anos, trabalhava em uma farmácia do bairro e tinha ajudado mulheres atacadas a tirar os pontos de onde foram feridas e tinha medo de ser uma vitima. E acabou sendo.

 

         Mesmo tendo reforçado a segurança da sua casa, o homem conseguiu entrar.


         Os moradores começam a fazer vigílias nas ruas, na tentativa de pegar o Maniaco. Eles se revezavam nas portas das casas.

 





         A policia fazia rondas.

 

         Dentro de casa, as famílias mantinham alguem acordado tomando conta de quem dormia e depois as pessoas revezavam.

 

         Só que, o Maniaco além de ousado era esperto.

 

         Ele deixa de atacar só a noite e passa a atacar a tarde.

 

         E essa mudança de modus operandi, deu a certeza de que quem ele fosse, morava lá.

 

         Os anos 80 eram muito diferentes do que é hoje. Eu sou uma pessoa nascida nos anos 80 e não era só a musica que era completamente diferente, a mentalidade das pessoas tambem era. E demais.

 

         Essas mulheres eram atacadas, iam para o hospital mas não denunciavam nada e quando contavam, algumas se recusavam a dar o nome do marido por exemplo. Como aconteceu com Odila.

 

         Odila Alves da Silva foi atacada 4 da tarde. Ela foi encaminhada para o hospital, foi atendida, mas ao ser ouvida pela policia, se recusou a dar o nome do marido ou de sequer avisa-lo do que tinha acontecido, segundo ela, por medo de como ele se sentiria.

 

         Imagina que loucura? Eu já disse isso e repito:  o maior medo de uma mulher é ser estuprada e por mais que esse maníaco não tivesse violentado sexualmente ninguém, ele entrava na casa e cortava as mulheres na bunda, então imagina o desespero. Porque uma pessoa tinha tido a oportunidade de fazer com elas o que queria. E além do medo, da vergonha, da agonia, ainda tinha a cultura da época em que a honra e o nome do seu marido devia ser preservado, cuidado.

 

         Ela até chegou a dizer que estava na hora da população se armar e matar o Maniaco.

 

         So que, assim como ocorre com assassinos em serie e com estupradores em serie, uma hora eles deslizam. A confiança na impunidade vai crescendo com a quantidade de ataques e é aí que eles são pegos.

 

         Ele ainda não seria pego, mas o maníaco Cortabundas cometeria o seu primeiro erro.

 

         Maria Lucia Lopes, 24 anos, foi cortada na madrugada com um canivete, mesmo com a sua família inteira em casa, mas ela conseguiu ver uma parte do rosto dele, enquanto ele fugia.

 

         Dois dias depois, uma menor, a S. de 10 anos, foi atacada as 3 da manha. Ela gritou pelo pai. Ela estava dormindo na sua rede quando o maníaco entrou. O pai não conseguiu chegar a tempo de ver o maníaco, que entrou na casa arrombando uma janela, mas a menor conseguiu ver quem o homem era e o descreveu como sendo um homem alto, moreno, peito muito peludo, vestindo bermuda, tenis e sem camisa.

 





         A menina precisou levar 100 pontos.

 

         O maníaco se descuidou e algumas vitimas o viram.

 

         Até o dia em que uma delas, reconheceu o maníaco em uma padaria no bairro.

 

         Era Luiz Donald Uchoa Felix, conhecido como Mc Donald. Luiz era filho de um motorista da secretaria de segurança publica e de uma chefe do tráfico. Um casal inusitado ne?

 

         O Mc Donald era criado em José walter então todo mundo o conhecia.

 

         Mas a policia não chegou a tempo.

 

         Mirtes, mãe de Mc Donald, soube da suspeita da policia e do seu reconhecimento e providenciou a passagem pra que ele fosse pra Brasilia.

 

         O cara fugiu.

 

         Ele ficou escondido em Ceilândia, uma cidade satélite e trabalhando em uma oficina mecânica. Porem, além de fujão era um homem apaixonado e mandou uma carta pra uma das mulheres que ele estava saindo no José Walter.

 

         O pai dela, acabou encontrando a carta e entregou na delegacia. Pronto, a policia agora sabia onde ele estava e mandou buscar.

 




         Nesse periodo entre reconhecerem, fuga e prisão, nenhum outro ataque aconteceu, então as pessoas respiraram aliviados. Era o Cortabundas e aquele pesadelo tinha finalmente terminado.

 

         Só que não.

 

         Não demorou muito tempo e novas mulheres foram atacadas de novo. Alguem com o mesmo modus operandi.

 

         Entrar na casa sem fazer barulho, sem chamar atenção de vizinho, sem que a vitima notasse algo diferente. Cortava as nadegas com um objeto afiado e saia sem ser visto.

 

         Dessa vez, não demorou tanto tempo pra que alguma vitima conseguisse ver o homem e conseguisse identifica-lo.

 

         Aparecido dos Santos Reis, o Topo Gigio, foi reconhecido.

 

         Ele morava na favela do Barracal, do lado do Conjunto José Walter e foi reconhecido por duas mulheres.

 

         Dois policiais, Soldados Irio e Leonardo,  fingiram ser cabos eleitorais, chamaram na casa dele e o prenderam no dia 12 de outubro de 1986.

 




         E o que intrigou os policiais era que, Topo Gigio era muito amigo de quem? Do Mc Donald.

 

         Na casa dele foi apreendido estilete, peruca loura e um tipo de graxa, que eles acharam que ele usou no corpo pra ajudar a deslizar pelas portas e janelas arrombadas.

 

         Entao qual era a crença da policia. Mirtes, contratou Topo Gigio pra cometer os crimes e a acusação sair do filho dela.

 

         Como que o filho dela seria o Cortabundas se ele estava preso e os ataques voltaram?

 

         Ambos os homens presos negavam serem o Cortabundas.

 

         E adivinhem? Os ataques voltaram.

 




         O negocio não tinha fim. Parecia que as mulheres do José Walter jamais teriam paz.

 




         Em janeiro de 1987, Jonas Lopes de Souza estava em casa quando o Maniaco, talvez desavisado ou sem saber que haveria alguem acordado, entra na casa. Os dois brigam, trocam socos. Era a primeira vez que alguem tinha um contato tao próximo com o maníaco.

 

         Mas apesar da briga, o Cortabundas leva a melhor e escapa.

 

         Berenice Borges de 30 anos, morava na Rua 85, casa 841. Naquele mesmo mês de janeiro, estava em casa, dormindo com a sua filha, quando ambas foram vitimas do maníaco Cortabundas.

 




         Mas Berenice e a filha, viram o rosto dele.

        




         No mês seguinte, enquanto estava na porta de casa sentada, Berenice ve um homem de bicicleta passando na sua rua.

 

         O coração dela acelera na hora. Ela sabe quem aquele homem era. Era o Cortabundas.

 

         Um vizinho era policial e ela corre até a casa dele imediatamente e avisa que viu o homem de bicicleta e ele estava ali na quadra deles.

 

         O policial corre na delegacia, os soldados, Luis, Tabajara e Jeovani, com o delegado Francisco José,  saem na viatura pra rodar as ruas a procura do homem de bicicleta.

 

         Não fica claro como, mas o homem acaba caindo da bicicleta. Não sabemos se no desespero de tentar fugir ao notar que a viatura o seguia.

 

         O certo é que, perto do Hospital Distrital Gonzaga Mota, onde as vitimas foram atendidas, o Cortabundas, bem, pelo menos mais um Cortabundas, é preso.

 

         No mesmo dia, 06 de fevereiro de 1987, ele é encaminhado a 8ª delegacia. Ele não reagiu, não reclamou. Acompanhou os policiais calmamente e na delegacia, confessa tudo.

 




         Com ele, os policiais apreenderam 6 giletes, pontas de ferro e alguns recortes pornográficos.

 

         Francisco Evandro Oliveira da Silva tinha 26 anos. Era filho de Antonio Roberto da Silva e Maria Oliveira da Silva. Nascido e Criado na favela do Barracal. Morava na Avenida dos Expedicionários, numero 3.395.

 




         Em interrogatório, confessou ter atacado entre 10 a 12 mulheres.

 

         Quando as pessoas souberam da prisão, a porta da delegacia encheu de pessoas querendo linchar Francisco.

 





         Foi uma confusão.

 

         Todo mundo queria ouvi-lo. A imprensa correu pra delegacia.

 

         O que ele contou é que começou a atacar depois da prisão de Mc Donald, meses antes, em junho de 1986. A imprensa só falava sobre isso, as pessoas só falavam sobre isso então ele queria essa sensação e decidiu começar a atacar.

        





         Antes de atacar, procurava saber qual casa seria melhor e em alguns casos ate arrombava antes, pra ser mais rápido.

 

         Berenice, Deljevania, uma vitima recente, e o Jonas, foram chamados pra fazer o reconhecimento na delegacia.

 

         Cinco homens foram postos em fila, com Francisco entre eles, e as 3 vitimas foram enfáticas ao reconhecerem o Francisco Evandro.

 




         Pra abrir as fechaduras ele usava uma chave de fenda com o cabo enrolado num pano.

 




         E foi ate curioso, porque alguns meses antes da prisão, o Francisco já tinha ido aquela delegacia. E por vontade própria.

 

         A bicicleta dele foi furtada. E ele foi la prestar queixa. Dá pra acreditar? Ele não tinha documentos de identificação então ficou detido um periodo na delegacia. Quando os policiais se distraíram ele fugiu. E a bicicleta que ele tinha perdido, acabou achando, porque era a mesma bicicleta que ele usava pra ir ate as casas.

 

         A primeira vitima do Francisco foi uma moça que trabalhava na casa dos pais dele, pra saber se conseguiria.

 

         Quando ele foi preso, a mae dele foi ouvida. Ela disse que um dia ou outro ela sabia que o filho seria preso, apesar de não imaginar que ele poderia ser o Cortabundas.

 

         Ela disse andar muito preocupada com ele. Ele estava de repente aparecendo com dinheiro, estava estranho em casa, com um comportamento diferente. Um dia ele disse pra ela que estava fazendo algo errado mas que era melhor não falar nada e deixar pra lá.

 

         E contou uma historia. Quando Francisco era criança, caiu e bateu a cabeça muito forte. O médico que atendeu disse que ele precisava de tratamento ou morreria. Se não morresse, cresceria com problemas mentais que não dava pra saber como seriam. Mas sem dinheiro sem condições, os pais nada fizeram.

 

         Na lua cheia sempre tinha fortes dores de cabeça. E por algumas vezes, teve ataques epiléticos.

 

         Francisco era frio, calmo e parecia não estar preocupado com a prisão dele.

 





         Perguntaram se ele se masturbava com os ataques e ele disse que até tinha vontade, mas se masturbar demoraria e ele podia ser pego.

 

         Em conversa com um repórter, disse que não estava arrependido, que começou a atacar talvez em maio de 1985 ( o que contrariava o que ele disse no interrogatório, já que o Mc Donald foi preso so em junho de 1986).

 

         Umas das ultimas vitimas precisou ficar 2 semanas no Hospital internada, tamanho o corte foi profundo.

 

         Em uma busca na casa dos pais, foi encontrado uma maleta com revistas pornôs, fotos de mulheres sensualizando.

 









         A confusão na delegacia era enorme então Francisco foi transferido para o prédio da Secretaria de Segurança, nas instalações da Delegacia de Defraudações e Falsificações.

 

         Foi para o IML fazer um exame de insanidade mental a pedido de um juiz, que eu não achei o resultado ou, se era comum esse tipo de exame ser feito no IML.

 

         Quase vinte dias depois da sua prisão, Francisco foi transferido para o Instituto Penal Professor Olavo Oliveira.

 

         Francisco não estava nem a 10 horas na cela da triagem numero 6, quando um grupo de presos conseguiu acessar o local. A cela era fechada somente com um parafuso preso a parede do lado de fora com uma porca. O grupo, que se dizia ser contra estupradores e tarados além de linchar Francisco, o assassinaram com estocadas de cossoco. Uma faca artesanal, feita por presos, que é um pedaço de ferro afiado preso em um pedaço de madeira ou plástico como cabo.

 





         Francisco morreu no dia 25 de fevereiro de 1987 com 20 perfurações, 8 só no peito.

 

         Dois apenados foram acusados da morte, Pecoen e Fonfon.

 





         Um deles, olha a coincidência, era ligado a Mirtes, mae de Mc Donald.

 

         Os dois negaram tudo. Disseram que viram a algazarra na triagem mas que ao chegarem, Francisco já estava morto.

 

         Aparecido, o Topo gigio e o Luis, o Mc Donald, acabaram soltos e continuaram morando no José Walter.

 

         Os ataques pararam. Nunca mais nada aconteceu.





Fontes de Pesquisa


O Povo

Fortaleza Em Fotos

Fortaleza Nobre

Blog Jairton Lopes

BND Digital

Blog Religiao Popcorn

Documentário O Corta Bundas


 

Comentários

Postagens mais visitadas