T02 Ep20 O caso Alcides
O caso
Maria Luiza do Nascimento, teve 4
filhos: o mais velho, Alcides e 3 meninas.
Para
sustentar a família, sozinha, começou a trabalhar como catadora de lixo.
E
foi catando lixo para reciclagem, que ela conseguiu criar os filhos. E por toda
a vida, o que mais desejava é que os filhos, tivesse uma história de vida
completamente diferente da dela.
A
família morava na comunidade Vila Santa Luzia, no bairro da Torre, em Recife.
Em
julho de 2007, a família Nascimento ficaria nacionalmente conhecida, quando Alcides
apareceu em uma reportagem local, feita na porta da UFPE, Universidade Federal
do Pernambuco.
A
afiliada local, fazia uma matéria sobre a reação dos aprovados no vestibular da
UFPE e, a alegria da família, pulando de felicidade ao verem o nome dele na
lista, chamou atenção do repórter.
A
emoção era tao genuína e tao forte, que tanto o Fantástico quanto o Globo
Reporter, fizeram matérias com a família.
Alcides do Nascimento Lins tinha 22 anos e passou em 1º lugar de Biomedicina para alunos de rede publica. Um feito extraordinário para alguem vindo da rede publica, morador de comunidade, filho de mae solo. Mas, o Imperador, apelido de Alcides, sempre batalhou e estudou pra realizar aquele sonho da mãe, o de que seus filhos, tivessem uma vida completamente diferente da dela.
Apesar
das diversidades, Alcides era um excelente acadêmico. Esforçado, estudioso,
resiliente, focado. Ele sabia o que queria e estava caminhando para isso. Era
um exemplo para os colegas de turma, uma inspiração para as irmãs, sendo
incentivando-as a não desistirem e estudarem, porque nada era impossível.
Em
2009, ele começou a estagiar no Hemope de Recife e virou bolsista da Fundação
de Amparo à Ciência e Tecnologia. E com o dinheiro da bolsa, ajudava a mãe no
sustento da casa e pagava o cursinho de uma das irmãs, que iria prestar
vestibular para Fármacia na UFPE.
Mas
lamentavelmente, uma tragédia encerraria a vida de Alcides abruptamente e antes
do tempo.
No
dia 05 de fevereiro de 2010, perto das 23:30, a mae e as irmãs de Alcides,
ouvem barulhos altos na porta de casa. Eram 2 homens chutando a porta. Um mais
velho outro aparentando ser bem novo.
O
mais velho, pergunta sobre duas pessoas: Tiago e Saúba.
Alcides,
que tinha acabado um trabalho para a faculdade e se preparava para dormir, vai
ver o que estava acontecendo.
Alcides
diz aos desconhecidos, que um dos homens que ele procurava, era um vizinho,
morava na casa ao lado.
Os
homens, já eram conhecidos do bairro, moravam ali e a vizinhança sabia que eram
envolvidos com o crime.
A
casa ao lado, indicada como sendo de um dos procurados, estava vazia.
Com
raiva por não estarem encontrando quem queriam, os dois homens voltam. E
insistem em saberem onde eles estariam.
Alcides
não sabia. Como ele, suas irmãs e sua mãe poderiam saber onde o vizinho estaria?
Ainda
assim, o homem mais velho, irritado, não queria ouvir e nem perder a viagem.
Foi até ali para matar e não sairia sem matar.
Sem
qualquer motivo, sem qualquer reação de Alcides, o homem mais velho saca um
revolver 38, aponta e atira na cabeça de Alcides. O tiro acerta no olho.
Alcides
cai bem no meio da sua rua, na frente da mae, das irmãs... O homem que atirou
não estava satisfeito. Ordena que o menor que o acompanhava, pegue o revolver e
atire tambem.
Ele
dá um tiro na nuca de Alcides, já caído no chão e sem chance de tentar se
defender.
Alcides,
foi socorrido e levado para o Hospital da Restauração, mas não sobreviveu.
Ali,
aos 22 anos, de forma brutal e sem sentido, terminava a vida de um jovem, que
tanto lutou pra mudar o estigma de quase todo jovem nascido e criado em
periferia, de família pobre e preto, tem nesse pais. Que estava lutando para
mudar a sua realidade e a realidade da sua família atraves da educação.
O
caso ganhou repercussão nacional. Alcides voltou a ser matéria no Fantástico
não pelo que com certeza teria conquistado, mas por ser vitima de uma violência
e sadismo, sem explicação. Por ser mais um jovem preto que a violência leva em
uma comunidade desassistida pelo poder publico.
O
enterro aconteceu no dia seguinte, no Cemitério Santo Amaro e uma multidão de
pessoas compareceu para prestar homenagem a quem inspirou tantas pessoas a sua
volta.
O
reitor na época, da UFPE, Amaro Lins, chorando emocionado, por ser próximo de
Alcides e acompanha-lo na Universidade desde o começo de perto, disse aos
repórteres no dia:
“ Alcides era um ser
humano extraordinário. Não era só um bom aluno, um ótimo estagiário. Era um
exemplo de superação para todos nós, que muitas vezes, diante das dificuldades
mínimas, desistimos dos nossos sonhos”.
Após
boatos e ameaças de morte, Dona Maria Luzia e as filhas foram colocadas sob
proteção da policia, durante a fase de investigação.
O
delegado responsavel pelo caso, Isaias Novaes, conseguiu identificar os
suspeitos.
Os
assassinos eram de uma facção rival ao dos homens que procuravam, que eram
envolvidos com tráfico e estavam devendo pagamento de drogas.
O
homem mais velho, foi identificado. Era
João Guilherme Nunes Costa.
João
Guilherme, já era conhecido do sistema prisional de Recife. Guigo, como era
conhecido, foi condenado por homicídio e tinha cumprido 6 anos, 5 meses e 7
dias quando ganhou o semiaberto. Ele estava preso na Penitenciaria Barreto
Campelo, em Itamaracá e no dia 11 de janeiro daquele ano, 2007, foi transferido
para a Penitenciaria Agroindustrial São João. Duas semanas depois, fugiu da
penitenciaria.
O
menor de idade que o acompanhava e participou do assassinato, foi localizado na
Avenida Caxangá em Iputinga e recolhido.
A
frieza dele, ao relatar tudo que aconteceu, foi impressionante.
Contou
que no dia bebeu, mas que estava sóbrio quando foram para a Vila Santa Luzia
atras de Tiago e Saúba. E sem qualquer remorso, confirmou que atirou em Alcides
quando ele já estava no chão.
A
arma usada ficou com ele, mas vendeu por R$ 300.
Passado
alguns meses, João Guilherme foi encontrado.
Ele
e o menor foram acusados pelo assassinato e julgados.
O
menor foi condenado a medida socio-educativa, mesmo já tendo cometido outros
crimes anteriores ao homicídio.
Joao
Guilherme foi condenado a 25 anos em regime fechado. Vinte e um anos por
homicídio qualificado (motivo torpe e recurso que impossibilitou a defesa da
vitima) e 4 anos por corrupção de menor.
Foi
enviado para cumprir pena no Presidio barreto campelo.
Uma
das irmãs de Alcides, Ana Paula, a quem ele ajudava e incentivava, pagando o
curso pre vestibular, logo após a morte
de seu irmão, passou para a UFPE em Fármacia.
Outra
irma, tambem passou posteriormente para a UFPE.
Todas
as filhas de Dona Maria Luzia, tantos anos trabalhando como catadora de lixo,
formaram-se no ensino superior.
Em
2012, ela entrou na justiça com um pedido de pensão vitalícia. Ganhou em
primeira instancia porem em 2019, o pedido foi negado pelo juiz Andre Carneiro
de Albuquerque. O valor pedido era de R$ 3.500. A ação de pensão alegava que o
Estado foi omisso, por permitir q fuga do homem que assassinou seu filho.
Uma
escola técnica em Camaragibe recebeu o nome de Alcides.
Rafael
Guerra, jornalista, escreveu um livro, chamado “Alcides: o trágico fim de um
sonho”, contando a historia de Alcides, de vida e de superação.
Infelizmente,
um jovem com todo um futuro brilhante pela frente, não resistiu a violência. A barbárie,
a perversidade de alguem, que não deveria estar solto na rua.
Mas
Alcides não se foi sem antes deixar um legado de força de vontade e
determinação.
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