T01 Ep04 O caso Governador do Acre


O CASO


            Edmundo Pinto de Almeida Neto, nascido no dia 21 de junho de 1953, natural do Rio Branco, capital do Acre e morto no dia 17 de maio de 1992, em São Paulo.

            Formado em Direito na Universidade Federal do Acre. Em 1974, se candidatou a deputado estadual pelo ARENA, mas perdeu e em 1976, ainda pelo ARENA, perdeu novamente, mas a disputa pelo cargo de vereador. Só para esclarecer, para quem nunca ouviu falar do ARENA. O ARENA foi um partido político criado em 1965 após o golpe militar para ser o partido da base do governo, o partido da situação, já que no Brasil, foi adotado o sistema bipartidário, com o ARENA como partido da base e o MDB como partido da oposição, até 1979, quando o governo restaurou no país o pluripartidarismo.

            Com a volta do pluripartidarismo, Edmundo decidiu permanecer filiado ao PSD, uma vertente oriunda do antigo ARENA e foi eleito vereador em 1982 e a deputado estadual em 1986. Em 1990, ganhou a eleição a governador do Estado, sendo empossado em 15 de março de 1991.


Edmundo Pinto de Almeida Neto





Edmundo com a familia no dia da posse 

            Nesse mesmo ano, Edmundo resolveu retomar a ideia da obra do chamado Canal da Maternidade. Já havia tido uma tentativa de iniciar essa obra em 1977, mas o governo federal não deu andamento.

            Em fevereiro de 92, o ex-diretor do INSS divulgou um áudio em que o Ministro do Trabalho e Previdência, Antônio Rogério Magri, confirmava ter recebido 30 mil dólares de propina da Odebrecht, empresa que havia ganho a licitação do Canal da Maternidade, para facilitar a aprovação e liberação de fundos do FGST para o projeto. O ministro havia sido demitido pelo presidente Fernando Collor de Mello, a menos de 1 mês antes, quando a imprensa nacional começou a escrever sobre a denúncia de que a obra em Rio Branco estaria superfaturada. Em março, o governador do Acre, suspende a obra e a Assembleia Legislativa do Estado, abriu uma CPI para investigar as denúncias.

Antônio Rogério Magri, Ministro do Trabalho e Previdência, em depoimento a CPI do FGTS


            O Congresso Nacional tambem abriu uma CPI do FGTS e o governador, foi chamado para depor na CPI em maio.

            Uma comitiva formada pelo governador, Luís Carlos Pietchman, chefe da Casa Civil, ajudante de ordem e capitão da PM, Marcos Winmann, deputado estadual Ison Ribeiro e os engenheiros Gilson Mascarenhas e Wandervan Rodrigues, que foi o autor do projeto do canal aprovado e era presidente da Companhia de Habitação do Acre (guardem esse nome), foram primeiro a São Paulo, encontrar com funcionários da Odebrecht para alinharem como seria o depoimento do Edmundo antes dele ir a Brasília.




            Eles se hospedaram no hotel Della Volpe Garden, na Frei Caneca no dia 14 de maio de 1992.

            Inclusive, um pouco antes do Edmundo viajar, o prédio da Assembleia do Acre (que como eu disse, estava tambem investigando a Odebrecht) pegou fogo e os documentos relativos a CPI que estavam no prédio sumiram.




            No dia 16, Edmundo, Luís Carlos e Marcos, foram a um cinema na Avenida Paulista assistir ao filme “Cabo do Medo”, retornando ao hotel por volta da meia noite.

            Já pela manhã cedo, do dia 17, uma atendente da PM recebe uma ligação de uma norte americana, alegando que o marido estava no Hotel Della Volpe, amarrado no quarto 714 depois de ter sofrido um assalto. A atendente liga para a recepção do hotel e pede que eles confirmem se há hospedado alguem com o nome que a mulher forneceu. O hotel confirma que havia então a atendente pede que eles verifiquem se ele está bem.

            Dois funcionários vão até o quarto e encontram o hospede amarrado. Ele conta que ouviu tiros. Os funcionários então rondam o andar batendo nos quartos com a tarja vermelha pra ver se os hospedes estao bem. Como os quartos com tarja verde, eles imaginam que estejam vazios, na hora, eles não vão até o quarto 704, que era o do governador. Os dois então vão até a recepção verificar a lista de nomes que estao no andar para conferir se falaram com todos e percebem que 1 dos quartos com a tarja verde, está ocupado pelo governador do Acre e é quando ao voltarem, encontram Edmundo de cueca, de costas, entre a cama e uma das paredes do quarto.  

            Agora vamos relatar os eventos que se seguiram de acordo com a Polícia Civil de São Paulo:

Na madrugada do dia 16 para o dia 17, entre as 2hrs e 2:30hrs, 3 homens invadem o hotel para assaltar. Em depoimento, o gerente do hotel aponta que, em março, um funcionário do hotel, havia sido demitido por estar furtando os hospedes. Em fevereiro, um molho de chaves de uma camareira que deixou o seu carrinho no 7º andar e foi almoçar. O molho de chaves foi depois encontrado no poço do elevador, porém faltando a chave mestra do andar.

            Todos os quartos do hotel, tinham uma tranca por dentro e as camareiras possuíam uma chave mestra, que só abria as portas se não estivem com a tranca acionada (a tranca era parecida com aquelas de banheiro de shopping, que quando acionada trancando a porta fica com uma sinalização vermelha e quando não acionada fica verde) e o gerente, tinha a chave gran mestra, que abria as portas em caso de emergência, independente da trava.

Em posse do nome do funcionário e o endereço, a polícia foi atrás do Gilson e descobriu que ele estava em Minas para a casa de um tio e eles foram até lá buscar ele para um interrogatório.

De acordo com Gilson (19), ele furtou a chave mestra da camareira e achou que jogando as chaves pelo elevador, ninguém iria descobrir.

Ele chamou um vizinho, chamado Edilson (19) para ajudar no assalto e um amigo chamado Jomildo (22). Como nenhum deles tinha uma arma, conseguiram com um conhecido chamado Jorge que, em troca de uma parte do que eles conseguissem com o roubo, emprestaria a arma.

            Jomildo arrumou uma moto emprestada para a fuga então ficou combinado que, Gilson iria na garupa do Edilson e Jomildo iria na moto emprestada.

            De acordo com os 3, no dia 10/05 eles já haviam tentado entrar no hotel, mas a moto do Edilson teve um problema. No dia 13 eles voltaram a tentar entrar no hotel pela porta dos fundos, mas o vigia do prédio da frente viu, acendeu as luzes e eles acharam melhor desistir.

            Gilson havia pedido que um outro funcionário do hotel, chamado Carlos Alberto, conseguisse a cópia da chave dos fundos, porque aí seria mais fácil pra eles entrarem sem chamar atenção e sem perder muito tempo. Carlos então conseguiu a chave, deu pro Gilson que tirou uma cópia e devolveu a chave original.


Os acusados: Carlos Alberto, Edilson, Gilson e Jomildo


            O vigia do prédio avisou ao gerente do hotel que tinham tentado arrombar a porta dos fundos, então o hotel colocou uma trava na porta pelo lado de dentro.

            A noite do dia 16, quando os 3 voltaram, mesmo com a cópia da chave, não conseguiram entrar por causa da tranca então 1 deles pulou o muro, abriu a tranca e deixou os outros entrarem. Já lá dentro, havia um salão de beleza, eles com a chave de lá que Gilson tbm já tinha conseguido com o Carlos Alberto, entraram, seguiram até a piscina, depois passaram pelo salão de convenções e chegaram até a escada de incêndio externa do hotel.

            Nos andares dos quartos, as janelas eram trancadas por dentro, exceto pelas janelas do último andar, o 11º. Os 3 então vão até o 11º, tiram uma folha de janela que dava para a sala de jogos, escondem atras da cortina e já dentro do hotel, se dirigem até o 7º andar. O 1º quarto que eles tentam entrar é o perto da escada de incêndio e que estava com o a trava verde, mas ele estava vazio. O quarto seguinte foi o do executivo do banco americano Northeast, o norte americano John Franklin Jones que estava dormindo.

            Ao entrarem no quarto e conseguirem amarrar o norte americano usando o fio do telefone do quarto, eles roubaram US$ 1.000 e alguns cruzeiros dele.

            O único quarto que tambem estava com a trava verde, era o quarto do governador do Acre, o próximo a ser invadido.

            Edmundo estava dormindo. Acordou assustado e partiu para brigar com o Edilson e entre a troca de socos, Edilson quebra um dente do Edmundo. Os 3 tentam dominar o governador, mas não conseguem. Gilson, que estava com a arma, diz que então, decidiu atirar nele. o tiro acertou o coração do Edmundo que mesmo atingido, teria levantado para continuar o embate e então, Gilson atirou novamente, que pegou no braço e de raspão na cabeça, atingindo o teto.

            Quando Gilson disparou o primeiro tiro, Edilson e Jomildo, saem correndo pelo corredor em direção a escada de incêndio, retiram a trava e pulam pra fugir.

            No quarto, ao lado, Luís Carlos, chefe da Casa Civil que estava na comitiva, como eu havia falado, dormia e de acordo com ele, não ouviu nada. Que a tv dele estava ligada passando um filme, e que por isso, ele não desconfiou de nenhum barulho [a tv deveria estar no volume máximo porque quem já teve infeliz experiencia de ouvir tiros, sabe que não tem como confundir com um tiro de filme sendo ouvido baixo, porque até um tiro longe, voce ouve como se fosse bem perto de voce, o som é muito alto].

            Mas, ao contrário do Luís Carlos, o norte americano, que tinha se escondido dentro do banheiro e que estava no fim do corredor, ouviu o tiro e se arrastou até a porta do quarto, ainda amarrado, pra tentar travar a porta com medo de voltarem e matarem ele.

            John tentou com os dedos do pé, ligar para a recepção do hotel, mas deu ocupado. Ele achou que o hotel estava sendo invadido então conseguiu com o pe ligar para a esposa dele nos EUA e avisar que estava amarrado no quarto e precisava de ajuda. A esposa dele, liga para a polícia civil de são Paulo e avisa que o marido foi assaltado e está amarrado no quarto. O atendente da PM resolve ligar para o hotel e pedir que eles verifiquem se tem alguem com o nome que ela forneceu hospedado lá e verificar se ele está bem.

            No laudo do IML, o médico legista reporta indícios de briga corporal no corpo do Edmundo, como um dente e unha quebrados.

            A perícia coletou impressões digitais na folha da janela encontrada escondida atrás da cortina do 11º andar e confrontou com as digitais do sistema de identificação civil do Gilson e deu match, houve um positivo.

            A princípio a polícia deixou a investigação com a motivação em aberto, havia a desconfiança de que o crime teria ocorrido devido a disputas políticas ou estavam relacionadas a CPI do FGTS, já que ele testemunharia em 2 dias em Brasília.

            Desde que, as investigações da obra do canal começaram, Edmundo Pinto vinha recebendo inúmeras ameaças de morte.

            A cobertura da mídia nacional durante o periodo do crime foi enorme. Assim que souberam do que havia acontecido, todos os veículos de imprensa foram para o Hotel Della Volpe, e não época, o Celso Russomano (esse mesmo da Patrulha do Consumidor e político de SP) era o chefe da assessoria de imprensa do Hotel, inclusive ele já trabalhava no histórico programa do SBT, chamado Aqui Agora que era um programa policial muito famoso nos anos 90 e que inclusive foi usado como fonte para esse roteiro.

            A família do Edmundo, na época e até hoje, lutam para provar que ele foi vítima de um crime político, uma queima de arquivo.


Edmundo e a esposa, Fátima


            Mas, o fim da investigação, a polícia classificou o crime como latrocínio (roubo seguido de morte).

            O relator da CPI do FGTS, conclui que houve um superfaturamento de 117% no contrato do projeto de obra do Canal da Maternidade. A licitação acabou sendo suspensa e no ano 2000, a Justiça condenou a Caixa Economica a realizar o financiamento da obra que ficou pronta em 2002. Inclusive ano passado, o governo atual começou uma revitalização do Canal.

            Indo um pouco mais a frente, para o ano de 1995, o engenheiro Wandervan Rodrigues (lembram que eu falei lá no início para vocês guardarem o nome? Então....) no dia 07 de julho de 1995, ele foi assassinado com 4 tiros. E o porquê de isso ser relevante? Então.... Wandervan tinha um diário secreto e no diário ele dizia que ele vinha sendo ameaçado de morte há muito tempo por causa da obra do canal, que ele já havia sofrido tentativas de morte e que ele estava com medo. Um pouco antes de morrer, ele se apressou a quitar o financiamento da casa da família, aumentou o seu seguro de vida em 1000% e avisou a esposa, a família e a vários amigos que se acontecesse qualquer coisa com ele, acidente, ou atentado, era porque ele estava sendo jurado de morte pelo deputado federal Carlos Airton. E aí, 5 dias depois, da companhia de seguros confirmou a troca do seguro, ele foi assassinado. Para muitos no Acre, tudo isso era prova de que ele sabia que seus dias estavam contados e que não só a morte dele, como a morte de Edmundo tinham sido queima de arquivo. No mesmo mês de julho, a Marina Silva que era deputada federal pelo Acre, fez um discurso pedindo uma outra investigação das mortes.

            O próprio Pietchman que estava ao lado do Edmundo, depois do crime simplesmente sumiu do Acre e da vida pública. Só em 2010, ele apareceu novamente quando foi eleito para deputado federal pelo Distrito Federal.

            Uma CPI realizada pela câmara dos deputados sobre casos de pistolagem, disse que Edmundo foi morte por encomenda até porque o fato dos 3 acusados terem entrado no quarto para assaltar e saírem sem levar nada, mesmo a vista tendo um relógio caríssimo e dólares no quarto. E em depoimento nessa CPI, Gilson José dos Santos, que havia sido preso acusado do crime, confirmou que recebeu dinheiro.

            Edmundo Pinto de Almeida Neto, deixou 3 filhos: Pedro, Rodrigo e Nuana. E até hoje, muitos no Acre acreditam que ele foi assassinado por causa da corrupção que envolvia a política do acreano.

            E voce? Acha que foi um latrocínio como a polícia afirma que foi? Acha que talvez o que ele diria na CPI era tão perigoso que acharam melhor matá-lo? Foi um crime por encomenda?

            Até o próximo episódio!

           

Fontes:


https://contilnetnoticias.com.br/2021/05/assassinato-de-edmundo-pinto-completa-29-anos-relembre-mortes-de-outros-governadores-do-ac/

Gazeta do Acre

Folha Uol

https://contilnetnoticias.com.br/2019/02/rodrigo-pinto-reafirma-que-pai-foi-assassinado-por-alguem-de-sua-confianca-que-integrava-sua-comitiva/

Senado

Aqui Agora

Investigação Criminal

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